Apelo do Vaticano: não às homilias do tipo abstratas e moralistas

13/02/2015 10:37

 

IACOPO SCARAMUZZI

Apresentação do “Diretório Homilético”, vade-mécum com 156 parágrafos sobre a boa pregação.
Papa Francisco: «Muitas são as queixas em relação a este importante ministério e não podemos fechar os ouvidos»

A homilia:

·        “não é um sermão sobre um tema abstrato”,
·        nem “uma ocasião, para o pregador, abordar assuntos completamente desligados da celebração litúrgica e das suas leituras,
·        ou para fazer violência aos textos previstos pela Igreja, torcendo-os para adaptá-los a uma ideia preconcebida”,
·        não é “um puro exercício de exegese bíblica”,
·        “não deve ser usada como tempo de testemunho pessoal do pregador”,
·        não deve limitar-se a exprimir “simplesmente, a história pessoal do pregador”,
·        nem deve reduzir-se a um caráter “puramente moralista ou doutrinante”.

Cardeal Robert Sarah
Presidente da Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos
O Vaticano apresentou hoje (terça-feira, 10 de fevereiro) um “Diretório Homilético”, elaborado pela Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos presidida, desde novembro de 2014, pelo cardeal guinesano Robert Sarah, acelerada com Papa Francisco, publicado, na realidade, em dezembro passado, e em preparação já sob o pontificado de Bento XVI, quando à frente do dicastério estava o cardeal espanhol Antonio Canizares Llovera.

Em 156 parágrafos e dois apêndices, este vade-mécum endereçado a todos os bispos, sacerdotes e seminaristas do mundo repropõe as indicações sobre como desenvolver uma boa pregação e quais erros evitar.

O cardeal Sarah, em uma entrevista coletiva no Vaticano, explicou que o diretório “não nasce sem um porquê” e citou, a propósito, o que escreveu Papa Francisco na exortação apostólica Evangelii Gaudium (n. 135): “Muitas são as queixas em relação a este importante ministério e não podemos fechar os ouvidos. A homilia é a pedra de comparação para avaliar a proximidade e a capacidade de encontro de um Pastor com o seu povo. De fato – prosseguia o Papa – sabemos que os fiéis lhe dão muita importância; e eles, como os próprios ministros ordenados, muitas vezes sofrem, uns a escutar e outros a pregar. É triste que seja assim”.

O diretório é articulado em duas partes. Na primeira, intitulada “A homilia e o âmbito litúrgico”, descreve – explica o decreto de apresentação – “a natureza, a função e o contexto peculiar da homilia”, na segunda parte, Ars praedicandi [trad.: Arte e pregar], “são exemplificadas as coordenadas metodológicas e de conteúdo que a homilia deve conhecer e das quais deve levar em conta ao se preparar e pronunciar a homilia”. Seguem, finalmente, dois apêndices, um com as referências ao Catecismo da Igreja Católica e o segundo com referências aos “textos de documentos do Magistério sobre a homilia”.

Não se trata, portanto, de “uma coleção de homilias já prontas nem de um subsídio, como existem tantos, com explicações exegéticas, espirituais e pastorais entorno das leituras da missa”, explicou padre Corrado Maggioni, subsecretário do dicastério, nem o diretório pretende “introduzir novas normas, mas recolher disciplinas existentes”.

Entre as várias indicações, o apelo a prestar uma atenção particular àquelas celebrações onde estão presentes também não católicos ou, em todo caso, pessoas que talvez não frequentam missa todos os domingos, como no caso de matrimônios e funerais com missa. Insiste-se que a homilia pode ser feita “somente pelos bispos, pelos sacerdotes e pelos diáconos”, enquanto um leigo, explicou padre Maggioni, pode “oferecer um testemunho” temático se no calendário litúrgico ocorrer uma jornada específica, ou, em sentido geral, pode intervir com uma “pregação” na Igreja, mas fora da “ação litúrgica”, que é reservada “ao ministério ordenado”.

Com relação à brevidade da homilia, é invocado o que foi escrito por Papa Francisco na Evangelii Gaudium (“deve ser breve e evitar parecer uma conferência ou uma aula”), mas também aquilo que se lê no Lecionário (“não demasiadamente longa nem muito breve”). A duração, esclareceu o cardeal Sarah em resposta aos jornalistas, “depende da cultura onde estamos: é claro que no Ocidente superar vinte minutos parece muito, na África, porém, vinte minutos não bastam, porque as pessoas vêm de longe para escutar a Palavra de Deus, se um padre fala dez ou vinte minutos não basta”. Diferente é o discurso para as missas de segunda a sexta-feira, quando é, em todo caso, aconselhável que se faça uma homilia, mas devido o fato que a “Eucaristia cotidiana é menos solene que a liturgia dominical e deveria ser celebrada de tal modo que todos aqueles que possuem responsabilidades familiares e de trabalho possam ter oportunidade de participar”, é necessário que “a homilia, em tais ocasiões, seja breve”. Quanto à aplicação destas indicações, “a responsabilidade é dos bispos”, explicou Sarah.

O diretório, disse o cardeal africano, não é dirigido a um específico país, porque “há dificuldades de homilia em todo lugar”, é um “problema mundial”. Dom Arthur Roche, secretário da Congregação [para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos], de seu lado, recordou uma outra passagem da [exortação apostólica] Evangelii Gaudium(n. 138): “A homilia não pode ser um espetáculo de entretenimento, não deve seguir a lógica dos veículos mediáticos [de comunicação], mas deve dar fervor e significado à celebração. É um gênero peculiar, uma vez que se trata de uma pregação dentro do âmbito de uma celebração litúrgica”. Será, pois, um “bom homileta [pregador]”, anotou o bispo, “quem, através da pregação homilética, for capaz de fazer isto:

·        guiar ao entendimento e apreciar aquilo que sai da boca de Deus,
·        abrir os corações à ação de graças a Deus,
·        alimentar a fé naquilo que o Espírito realiza para nós, agora e aqui na ação litúrgica,
·        preparar a uma frutuosa comunhão sacramental com Cristo,
·        exortando a viver naquilo que se recebeu no sacramento”,

enquanto que, “será um mau pregador [homileta] quem, mesmo sendo, talvez, um grande orador, não for capaz de suscitar estes efeitos”.

As homilias, acrescentou o vice-diretor da Secretaria de Imprensa vaticana, padre Ciro Benedettini, são “cruz e delícia” de todo padre e de todo fiel, “frequentemente cruz mais que delícia: o importante é que não façam os fiéis se adormentarem”. A homilia “deve ser o meio com o qual o sacerdote infunde em mim o desejo de conhecer ou reconhecer Jesus, apresentando-0 da maneira mais direta e clara, não retorcido ou parcial”, disse, por seu lado, Filippo Riva, membro do Pontifício Conselho das Comunicações Sociais, dando voz a quem escuta as homilias.

Traduzido do italiano por Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo.

Fonte: Vatican Insider / La Stampa – Vaticano – 10/02/2015